domingo, 11 de janeiro de 2009

Já te comi



Pára. Peito.
De repente abre os olhos aturdidos na varanda, depois de um sonho acordado sem receio. Ficou sem ar. O peito parado, no aguardo. E a realidade lhe cutuca com maldade a ferida de carne. Caminha até o quarto e se pinta, na frente do espelho que lhe diz quem é, mas não reflete o que pode ser. O que é debaixo da pintura grossa. Maravilhosa.
Rímel aos montes, pra deixar os olhos brigitte-bardot. Pós pra deixar o pó. Sexo escondido como nó. Agora sim, linda e maravilhosa, transformada em não-tem-quem-possa. Deslumbrante, deixa cair brilho. Pousa na flor. A janela aberta, as cortinas voando soltas com a força do vento. Prenunciando o momento. Deixando aberto o prenúncio de um horizonte. Uma linha que quando chega, trás novo caminho. Céu a ser voado.
O carro pára e ela se escora, sempre na janela. Presságio. Braço. Olho. Olho.
É grande o cacete? Do tamanho da tua sede.
Entra pra gente levar vento na cara. Fugir de qualquer canto. Onde não tem esquina. Onde flameja tua sina.
Travesti macumbeiro. Preconceito pro ano inteiro. Vamos dançar, ao som daqueles tambores férteis. A cada batida com mão aberta, forte. Liberta. Espermas explodem no ar, dançam em qualquer lugar. Todo lugar. Fecundam os ouvidos. Olhos entregues com cabeças prenhes. Corpos emprestados para bom uso. Cerveja e vinho. Carinho. Nada cognitivo. Suor. Suor. O quê? Calor. Muito calor. E dentro um vento de carro a 100 por hora. Demora. Demora.
Vamos? Pra quê? Pra comer. Já estou satisfeito. Refeito. Quero te mostrar a linha do fim da vista. Qual? Aquela ali ó. Deste tamanho? É. Bora.
Eu sei, tu quer me comer. Eu já te comi. Quando que eu não vi? Desde a hora que tu entrou no carro e eu sorri. Filho da mãe. Bota a cabeça pra fora e deixa teus cabelos louros e escrotos voarem, que eu quero ver. Acende o cigarro e deixa queimar. Todo a fumaça que ta aí dentro e não te deixaram soltar. Onde há fogo há fumaça. Uma desgraça. Uma ameaça. Com graça. Tudo em mim parece asa.
Chegamos, mas não pára o carro. Acelera. Mais a linha ainda está lá. Porra. Presa junto ao sol. Eu sei. Mas não tem como escapar. Em todo canto tem muro. Com pega-ladrão e tudo. Você tem que fechar. Teus olhos e mais o punho. Olhar pros lados e não ligar. Deixa o telefone tocar. Tocar. Tocar.
Mas travesti não é pra ninguém amar. Meu pai que disse quando botei vestido. Ele cuspiu no chão e me rasgou o intestino. Mas hoje eu tô aqui, perto do céu. Com água na boca, fogo no corpo e desejo no copo. Divino.
Eu não te disse que foste tu quem costurou esse sorriso aqui na minha cara? Que nem bordado de senhora ao nascer da madrugada. E o cuspe secou. Evaporou. Agora solta essa fumaça esparsa. Que o que te Mata não é o cigarro, é isso preso no teu seio farto. O cu é seu, faz o que quiser. Mas eu quero você toda. E essa agora? Vai bem me pedir em casamento. Pff. Não. Eu quero é lua-de-mel. Com todo direito a escarcéu. Orgia em mar revolto, que arrebenta. E salpica na cara escura de todo mundo que quer nos cortar. Conservar.
Contigo eu já casei, quando apertei tua mão e aqui cheguei.
Filho-da-puta.
Eu disse sim e nem conta me dei.

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