quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Rua das flores


Por maior que fosse o quarteirão eu sempre conseguia avistar o fim. O caminhar naquela rua poderia durar meses ou anos, dias ou décadas. Mas o tempo daquele bloco era incontável quando conversávamos sorridentes, nos olhávamos ansiosos.
As casas e prédios demarcavam fases e tornavam-se símbolos das sensações. O velho cinema virou aconchego, o parque de diversões satisfação e o café da esquina agora era saudade.
Por mais imperceptível que fosse, coincidentemente sempre observávamos as mesmas formigas ao chão, carregando folhas do dobro de seus tamanhos. Indícios dos detalhes que marcariam aquele quarteirão inteiro. Por menores que fossem, eram as coisas mais fortes.
Ouvia canto de pássaros que sobrevoavam nossas mãos, sem, no entanto vê-los, de tão vasto era o céu naquele tempo. Sabíamos exatamente o que nos cantavam aos ouvidos.
Chegava a hora de atravessar a rua e alcançar um outro quarteirão. Sabíamos que havia um fim, mas de vez em quando no caminho meus cabelos esvoaçavam, teus sorrisos pousavam, nossos olhos viajavam e de repente a gente esquecia que a calçada acabava. Amnésias incomensuráveis.
Reconfortante era saber que nossas memórias eram rua sem fim. Fechando os olhos sempre voltávamos àquela casa amarela de número um.