terça-feira, 1 de junho de 2010

Invisível Armadura


Após longas batalhas como um novato ingênuo, daqueles que correm com a arma sem olhar para os lados, cheguei aos novos fronts com blindagem na alma e olhos por todo o corpo. Qualquer sopro era motivo de atenção e isso me fez cicatrizar antigas feridas. Essa racionalidade, no entanto, me construiu também muros que empatavam minha visão. Tinha que me lançar ao campo do outro para poder fazer valer a roupa que vestia e o coração que carregava. Os muros dos mais fortes passaram a me seguir como cães vira-latas, cujos olhos pediam comida e carinho.

Uma voz do lado de fora me gritava. Um grito que virava sussurro. Então como se me falasse ao ouvido, com o queixo deitado em meu ombro, escuto reconstrução. A cada passo um pedaço ao meu redor caía, deixando a mostra uma parte do meu corpo. A cada gesto da pessoa ao meu lado, minha invisibilidade se tornava mais terna. Ela continuou lá fora por dias a fio, caminhando ao meu lado, mesmo sem notícias minhas atrás daquelas paredes cegas. Mas foram por aqueles gritos mansos, que pude continuar. Pois apesar de tudo não havia teto que me impedisse de ver aquele céu que as palavras me apontavam. O azul sempre esteve lá como ela. O cheiro de girassol com o rosto para cima inundava aquele quarteirão. O tempo, sem relógios nem pêndulos, passava e voltava ao passado. Memórias iam se acumulando como as armas ao chão.

Um dia, caminhando com o olhar cansado, mas com pálpebras em riste, quando menos esperei, estava nu. A neve se espalhava por todos os lados, as nuvens cinzentas me roubavam o azul e meus pés percebiam estar na mais perigosa área da batalha. Pois foi nesse momento que me senti mais aquecido desde o primeiro tiro, o instante que tudo ao redor se azulava com lâminas vermelhas ao fim do céu e a hora que senti maior segurança desde meu primeiro choro. Mesmo sem nada, minha mão direita foi inundada por outros dedos, que se faziam dez. Eles eram minhas roupas, meus muros, minhas armas, minha comida, meu coração. Com força me apertavam e me cobriam como chuva em terra momentaneamente árida, que aos poucos revia frutos acompanhados de flores. Percebi que do lado de fora eu também tinha a oportunidade de ajudar aquelas mãos que passaram dias me esperando. Mesmo longe foi quem me fizeram pular. Voar. A partir de então podia dar tudo de mim para fazê-las felizes.

Foi aí que pude me dar conta de que não precisava de tantas armas, nem tantos olhos. Precisava de palavras, de formigas, de mãos dadas. E sem aquele imenso medo que carregava no bolso como pedras, pude então avistar outros sóis. Mesmo se às vezes me queimavam, me engrossavam a pele e a coragem. E não me escondia mais, pois ao meu lado despido estava o meu amor com um sorriso ao colo e suas mãos que nunca mais deixariam de me vestir.

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